Gilberto Mariotti, 2010
A palavra paisagem vem do francês paysage, que por sua vez é formado por pays (de onde vem país), e age. Pays se refere a território, região, terreno, lugar. Age, em português, “agem”, tem dois sentidos possíveis: coleção e ação, ou resultado da ação.
Assim, temos um sentido de paisagem relativo à coleção de territórios, ou seja, à classificação de territórios e análise de suas características, e outro, relativo à transformação dos territórios por meio da ação de processos dinâmicos.
É neste segundo sentido que pretende se inserir Toporama, um misto de banco e estante, móvel e escultura, que já esteve se contorcendo pela Praça das Bibliotecas e se instalou no foyer do teatro do Centro Cultural São Paulo.
Há muito que os trabalhos de Daniel Acosta problematizam a pretensão de um olhar panorâmico que abrange o todo das possibilidades de visão. Isto já se sentia na série Paisagens portáteis, elaborada a partir de elementos e formas caras ao design e à arquitetura. No entanto, esta se caracterizava mais pelo sentido de paisagem associado a landscape, ou seja, a possibilidade de escape para que a visão se estenda por um território ou plano. Prevalecia ainda certa ironia que apontava para o desejo de liberação impresso nas mercadorias ou objetos ligados ao mercado do design. Ao espectador a reflexão sobre a impossibilidade de uma visão liberta se colocava mais fortemente quanto mais seu olhar se fixasse nos limites de funcionamento interno dos objetos.
Já neste momento atual da produção de Acosta, a ironia em relação à idéia de paisagem deu lugar à possibilidade de uma experiência participativa do antes espectador, agora usuário do espaço no qual convive o trabalho. A arquitetura passa a ser campo de atuação, onde seus procedimentos estão disponíveis numa relação com o público que, se por um lado, é mais funcional, por outro, encontra-se menos submetida ao próprio léxico arquitetônico. O trabalho não mais se posiciona como escultura que se refere ao campo da arquitetura, de um ponto de vista protegido das artes visuais. Movimenta-se em direção à fronteira entre esses territórios, que têm seu limite marcado pela ideia mesma de função. E passa a depender de uma condição fronteiriça para sua efetivação.
Deslocar-se de uma ironia à falta de perspectiva implica em abdicar de uma referência obrigatória à perspectiva clássica, que se organiza a partir de um ponto de vista único. O trabalho passa a pedir, por meio da relação, colaboração ou reação, a proposição de novas possibilidades de experiência ao sujeito que interage com os espaços, ele mesmo atuante por formas de agir e se comportar quotidianas, geralmente mais determinadas pelas relações espaciais do que se percebe.
Mas, para além da interação imediata com o objeto que se propõe a ser ponto de intersecção entre lugar e ação, o papel de sujeito requer a ocupação plena do lugar em que se vivencia a paisagem e seus processos. Deslocar-se da ação de presenciar para a de estar presente.